Educação ambiental prepara a sociedade para os dilemas do desenvolvimento.
por Bere Adams, da revista
Educação Ambiental em Ação –
Entrevista com Dal Marcondes
para a 66ª edição da Revista Virtual Educação Ambiental em Ação.
Apresentação: O entrevistado desta
edição é Dal Marcondes, um dos mais importantes jornalistas do
país que se dedicam as questões ambientais. Ele tem especialização
em economia e em sustentabilidade com foco em economia e negócios.
É, também, especialista em Ciência Ambiental pela USP. Atualmente
cursa Mestrado Profissional em Jornalismo Digital e Modelos de
Negócios em Jornalismo Pós Industrial e participa ativamente de
diversas atividades de Militância em Sustentabilidade e Jornalismo.
Além disto, é Presidente da Rede Brasileira de Jornalismo Ambiental
e Vice-Presidente da Associação Profissão Jornalista. É, ainda,
Presidente do Instituto Envolverde e diretor executivo da DAL
MARCONDES Consultoria & Comunicação. Será que teremos algo a
aprender com ele?
Jornalista Dal Marcondes
Bere Adams – Prezado Dal
Marcondes, é uma grande honra tê-lo como o nosso entrevistado. A
sua contribuição será ímpar para todos, e certamente poderemos
aprender muito a partir da sua vasta experiência. Muito obrigada por
aceitar o nosso convite. Normalmente começo as minhas entrevistas
perguntado: como o tema meio ambiente entrou em sua vida? Algo
aconteceu que despertou o seu interesse? Conta pra gente como foi o
seu ingresso nesta temática tão importante e essencial que é meio
ambiente.
Dal Marcondes – Minha relação
com o meio ambiente é uma paixão antiga. Quando eu era criança
meus pais saíram de São Paulo e fomos morar em uma cidade no
interior de Goiás. La aprendi a nadar em rio, andar a cavalo, comer
fruta no pé. Depois, em 1974 fui para a Amazônia e me embrenhei na
floresta, no Pará e no Maranhão. Até então, era uma relação
idílica. Quando voltei para São Paulo fui estudar jornalismo, me
tornei repórter e editor de economia. Foi quando compreendi que as
questões ambientais são essencialmente dilemas econômicos. Todos
os problemas socioambientais que enfrentamos no dia a dia têm origem
em decisões de caráter estritamente econômico.
Bere Adams – Qual foi o maior
desafio de sua jornada pelo jornalismo ambiental?
Dal Marcondes – Montei a
Envolverde em 1995 e o site entrou no ar em 8 de janeiro de 1998.
Quando contei a alguns amigos que iria largar a grande imprensa para
me dedicar ao jornalismo ambiental foi um deboche só. Um amigo me
disse que eu estava jogando a minha carreira de jornalista econômico
bem sucedido no lixo. Hoje eu acho que tomei a decisão certa, não
pelo dinheiro, acho que estaria ganhando mais na grande mídia, mas
pela qualidade da minha vida.
Bere Adams – Qual é, para você,
a importância da informação ambiental para lidarmos com os
desafios ambientais que se apresentam?
Dal Marcondes – Informação,
jornalismo independente e de qualidade são fundamentais para o
desenvolvimento de uma sociedade, de um país e para a qualidade de
vida no planeta. O cuidado que se deve ter é não confundir ser um
jornalista ambiental com ser um militante ambiental. O jornalista
trabalha com dados, fatos, informações e pluralismo de opiniões. O
militante trabalha com causa.
Bere Adams – Temos inúmeros
problemas ambientais e não seria possível abordarmos a cada um. Por
esta razão, destaco um deles que é de suma importância e se trata
de um dos grandes desafios que enfrentamos que é o da falta de
saneamento básico, que potencializa a proliferação de doenças, a
desigualdade social, a poluição… Como você percebe esta lacuna e
como a mídia lida com este assunto?
Dal Marcondes – Nenhum país do
mundo desenvolvido chegou lá sem antes resolver as demandas de sua
população em água potável e saneamento. Esse é o principal
problema a ser abordado pela sociedade brasileira nos próximos anos
e os números são assustadores. Menos de 50% do esgoto gerado é
coletado, e menos de 25% é tratado. Nossos ecossistemas recebem seis
piscinas olímpicas repletas de merda todos os dias. A mídia dá uma
atenção marginal a esse assunto. Não contabiliza as milhares de
crianças doentes nas filas de postos de saúde sem nenhuma estrutura
e não dá ouvido às pessoas que carregam esse subdesenvolvimento
nas costas. Apenas quando sai uma nova estatística os indignados de
plantão se manifestam. O apartheid brasileiro se define por quem tem
e quem não tem água e esgoto. No mundo dos políticos esgoto é
“obra enterrada”, não dá voto. Uma mentira que escorrega no
tempo e serve de bordão para desviar o dinheiro para bonitezas que
chamam a atenção de eleitores com torneira e chuveiro.
Diálogos Capitais, com a
participação da Senadora Marina Silva, no teatro TUCA, PUC;
Bere Adams – Fale-nos um pouco
sobre como as questões ambientais devem ser enfrentadas.
Dal Marcondes – As questões
ambientais devem ser encaradas e tratadas em toda a sua complexidade.
Não há simplicidade nas relações ambientais. Os impactos humanos
sobre a natureza devem ser continuamente estudados e mitigados e o
equilíbrio das ações deve se dar pela resultante da aplicação de
ciência e tecnologia sobre serviços ecossistêmicos de forma a
garantir o benefício para a sociedade sem impactar negativamente
biomas e ecossistemas. Não é simples, mas já temos a ciência e a
civilidade necessária. O papel do jornalista nesse cenário é
tornar transparente para a sociedade os critérios de cada decisão e
seus impactos e resultados.
Bere Adams – Para você, a
Educação Ambiental se relaciona com Informação Ambiental?
Dal Marcondes – Sempre! A educação
ambiental oferece ao cidadão os instrumentos necessários para
entender e agir em um contexto de complexidade e, principalmente, dá
os instrumentos necessários para decodificar as informações
ambientais para a tomada de decisão. Há que se ter em conta que o
analfabeto ambiental passará a vida tomando decisões baseadas em
desconhecimento, em incapacidade de cognição com o ambiente. As
pessoas que têm acesso a uma educação ambiental de qualidade – e
isso á mais do que reciclar lixo ou plantar uma florzinha – terão
uma visão de mundo mais integrada e capaz de decodificar a
complexidade ambiental em suas decisões pessoais e profissionais.
Bere Adams – Destaque qual projeto
você realizou e que considera mais significativo.
Dal Marcondes – Essa é uma
pergunta delicada para alguém como eu que tem mais de 40 anos como
jornalista. Mas, acho que minha contribuição para o jornalismo
ambiental, a criação da Envolverde e o fortalecimento da Rede
Brasileira de Jornalismo Ambiental estão entre as coisas que
considero um legado profissional. Porém, ainda há muito a ser
feito. Neste momento estou estudando modelagem de negócios para o
jornalismo digital, porque acredito que nos próximos anos o
jornalismo em ecossistema digital terá um papel estrutural para a
sociedade. Além disso, as novas plataformas digitais e redes sociais
precisam da atuação de jornalistas bem formados e remunerados por
projetos capazes de se sustentar. Essa é a parte da minha militância
pelo jornalismo.
Bere Adams – Você está a frente
da Envolverde, uma das revistas de jornalismo e sustentabilidade mais
importantes do Brasil. Conte-nos um pouco sobre a sua trajetória com
este informativo tão relevante.
Dal Marcondes – A Envolverde
entrou no ar em 8 de janeiro de 1998, há 20 anos, portanto. Um
estudo de uma universidade norte-americana identificou a Envolverde
como o mais antigo projeto de jornalismo nativo digital em operação
no Brasil. São duas décadas de invenções, inovações e
reinvenções em todos os sentidos. Tecnologias que mudam com o
passar do tempo, formatos de entrega das notícias, pautas, enfim,
não há muita rotina. O importante é o esforço cotidiano para
manter a relevância dos temas e pautas de nossas reportagens.
Bere Adams – Qual é a
contribuição da Envolverde para o desenvolvimento de atividades de
Educação Ambiental?
Dal Marcondes – Acho que a
informação que oferecemos cotidianamente tem ajudado muitos
educadores ambientais e formular suas ações, estratégias e aulas.
E queremos fazer mais, oferecer instrumentos mais adequados para o
uso em turmas das mais diversas idades e interesses. Vamos ver se
avançamos mais nisso.
Bere Adams – Com tanto tempo
trabalhando em veículos de comunicação ambientais, quais avanços
você poderia destacar, de forma geral, na área ambiental?
Dal Marcondes – Hoje há muito
mais informação sobre temas ambientais do que a 20 anos, quando
comecei nessa área. Há mais profissionais de jornalismo que se
interessam em obter uma melhor qualificação para tratar do tema
meio ambiente, com cursos de especialização e mestrado em ciência
ambiental, gestão ambiental, economia ambiental etc. Mesmo os
grandes veículos também dão mais atenção ao assunto, a pauta
ambiental deixou de ser uma pauta esporádica e tornou-se um assunto
de economia. Há profissionais trabalhando em organizações sociais
que se especializaram em temas específicos, como clima, água,
poluição, Amazônia, Oceanos e muitos outros. Em suma, há mais
gente olhando para o meio ambiente.
Bere Adams – Estamos em tempo de
mudanças de governo. Resumidamente, quais são as suas expectativas
sobre como será tratada a Política Ambiental?
Dal Marcondes – Esse é um tema de
muita apreensão. A perspectiva não é boa e por isso os jornalistas
e os profissionais da área ambiental em geral devem estar atentos
para avaliar e trabalhar sobre a realidade com a velocidade dos
acontecimentos. Não dá para pré-julgar, mas também não há um
horizonte de otimismo.
Bere – Para finalizar, deixa uma
frase, uma ideia que possa servir de inspiração para nossas
leitoras e nossos leitores.
Dal Marcondes – Temos grandes
desafios em termos de sobrevivência, principalmente neste século.
Este será um período decisivo para a história humana, quando temos
ciência, tecnologias e conhecimentos para tornar o futuro um bom
lugar para se viver. Nossas decisões cotidianas nos dirão como será
esse futuro e como irão viver nossos netos e bisnetos.
A humanidade é uma espécie ainda
na infância, temos menos de 5 mil anos do início da civilização,
2 mil anos desde o surgimento do cristianismo, pouco mais de 500 anos
da invenção da prensa, 200 anos da revolução industrial, pouco
mais de 100 anos do automóvel e do avião, 70 anos da televisão, 15
anos dos smartphones… Há espécies na terra que estão aqui há
milhões de anos, temos ainda muito a aprender.
Bere – Prezado Dal Marcondes, nós
da equipe da revista, agradecemos pela oportunidade de conhecer
melhor o seu trabalho, a sua jornada e as peculiaridades que envolvem
o jornalismo ambiental. Fica evidente a importância da informação
como referencial fundamental para o desenvolvimento de ações de
Educação Ambiental que promovam as mudanças de atitudes para um
futuro mais sustentável, muito obrigada! Parabéns e desejamos-lhe
cada vez mais sucesso!
Fonte: ENVOLVERDE
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