Poluição do ar em São Paulo
diminuiu pela metade com greve dos caminhoneiros.
De
acordo com o patologista Paulo Saldiva, greve permitiu experimento
natural raro que possibilitará medir o custo real da poluição na
capital paulista, que inclui internações, mortes e incapacitação
(foto: Marcelo Camargo / Agência Brasil).
A greve dos caminhoneiros no
Brasil resultou em transtornos graves para a população e para os
negócios. No entanto, a redução do tráfego, principalmente o de
caminhões, constituiu ambiente raro para avaliar índices e efeitos
da poluição do ar na capital paulista.
Os resultados são impressionantes:
em sete dias de greve as emissões em São Paulo caíram pela metade
em duas estações – Ibirapuera e Cerqueira Cesar – do Sistema de
Informações de Qualidade do Ar da Companhia Ambiental do Estado de
São Paulo (Cetesb).
De acordo com a comparação dos
dados diários sobre poluição atmosférica medidos pela Cetesb, os
índices de poluição aumentaram quando houve a liberação do
rodízio, seguidos de uma forte queda após a falta de combustível e
a redução de carros e a frota de ônibus nas ruas.
Na tarde de segunda-feira (28/05),
sétimo dia de greve dos caminhoneiros, a qualidade do ar na capital
paulista era considerada boa em todas as estações de medição e
para todos os poluentes analisados, algo difícil de ser registrado.
“Houve uma redução de 50% da
poluição na capital paulista. Esse é um episódio raro e vamos
estudar suas consequências na saúde pública. Quem sabe essas
evidências quantitativas sirvam de argumento para a criação de
políticas públicas”, disse Paulo Saldiva, diretor do Instituto de
Estudos Avançados (IEA-USP), durante apresentação no evento
“Diálogos
Interdisciplinares sobre Governança Ambiental da Macrometrópole
Paulista”, realizado no auditório da FAPESP.
Saldiva comparou os dados relativos
aos índices de monóxido de carbono (CO), dióxido de nitrogênio
(N2O) e partículas inaláveis na atmosfera. Os três índices,
diretamente ligados à liberação da queima de combustíveis, são
historicamente mais altos às segundas e sextas-feiras, quando há
mais trânsito na cidade, e caem nos fins de semana.
“Na semana anterior ao episódio,
a maior poluição foi na segunda e na sexta (14 e 18/05). Na
primeira semana da greve, a poluição começou alta e piorou com a
liberação do rodízio no dia 24 (quinta-feira). Quando a gasolina
começa a rarear, há menos carros nas ruas e a frota de ônibus
segue reduzida, os níveis de poluentes primários caem pela metade”,
disse Saldiva.
Com os dados da redução da
poluição, a equipe de pesquisadores do IEA vai agora fazer uma
análise mais completa do fenômeno e cruzar os níveis de poluição
e de congestionamento com os dados diários de mortalidade e
internações no período. O objetivo é medir o custo real da
poluição.
“A poluição tem um custo alto em
saúde. Existe a chamada perda de capacidade produtiva de uma
população economicamente ativa, ou seja, quanto dinheiro o Brasil
perde por uma fração produtiva da sua população morrer antes da
hora estipulada”, disse Saldiva.
É o chamado índice DALY (da sigla
em inglês para Disability Adjustment Life Years). “Isso é uma
moeda que pode ser precificada pelo PIB per capita regional e dá um
custo astronômico. Todo mundo sabe o preço de mudar, mas ninguém
sabe o preço de manter. Esse experimento vai permitir saber esse
imposto oculto, provavelmente muito maior que o subsídio. É uma
perda da saúde que todos pagamos e que não temos defesa individual:
a poluição atmosférica”, disse.
Desde o dia 21, caminhoneiros de
todo o Brasil fecharam mais de duas centenas de trechos de rodovias
no país, protestando contra o aumento do diesel. Como consequência,
aeroportos tiveram voos cancelados, supermercados não fizeram
reposição de produtos, a frota de ônibus foi reduzida em todo o
país e postos de gasolina pararam de funcionar por falta de
combustível. As ruas da cidade de São Paulo desengarrafaram.
Na última terça-feira (29), perto
das 18h, horário de pico, a cidade registava apenas 2 quilômetros
de engarrafamento nos 868 quilômetros monitorados pela Companhia de
Engenharia de Tráfego (CET).
Sem metrô
A equipe de pesquisadores teve a
oportunidade de medir a poluição de São Paulo em outra experiência
rara: a greve dos metroviários em maio de 2017. Naquela época, no
entanto, a poluição atmosférica dobrou. “Quando o metrô entrou
em greve, todo mundo saiu de carro. No dia, houve um excesso de 12
mortes. Então, o metrô funciona como um redutor da poluição”,
disse Saldiva.
A estimativa, desta vez, é que, com
a redução de carros e ônibus nas ruas, sejam evitadas pelo menos
seis mortes por dia na capital paulista. “Só teremos essa resposta
mais para frente, com os cálculos prontos”, disse.
Saldiva destaca que o episódio pode
ter um papel educativo. “Talvez esse estudo convença as pessoas de
que a volta ao diesel seja transitória. Talvez isso crie um capital
político para que essas mudanças para reduzir a poluição – como
melhoria do transporte coletivo, adoção de matriz energética mais
limpa, adensamento urbano – sejam mais toleráveis pela população”,
disse.
Fonte: Agência
FAPESP
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