A trilha da sustentabilidade.
Por Dal Marcondes*, especial
para a Envolverde –
A evolução do conceito de
sustentabilidade passa pela compreensão de um processo histórico
que começou na filantropia e evoluiu para uma permanente batalha
contra todas as misérias humanas.
Alguns anos atrás, uma empresa era
considerada socialmente responsável apenas por cumprir a lei, pagar
em dia seus impostos e gerar empregos. Além disso, ela poderia se
dedicar a ações de filantropia, nos quais seus recursos seriam
utilizados para mitigar algum tipo de dor social. No entanto, os
tempos mudam, e as necessidades também. A ação humana não é mais
localizada, mas tem impactos muito mais abrangentes e de alcance
planetário.
Nos anos 1980, a Organização das
Nações Unidas (ONU) encomendou um estudo à então
primeira-ministra da Noruega, Gro Brundtland. Esse trabalho foi
publicado em 1987 sob o nome “Relatório Brundtland” ou “Nosso
Futuro Comum”. Foi a primeira vez que um conceito para
sustentabilidade foi expresso e mundialmente aceito. De acordo com o
relatório, “ser sustentável é conseguir prover as necessidades
das gerações presentes sem comprometer a capacidade das gerações
futuras em garantir as próprias necessidades”.
Foi também a primeira vez que um
estudo patrocinado pela ONU chegou à conclusão de que é preciso
mudar os atuais padrões de produção e consumo adotados pelas
diversas sociedades da Terra, de forma a preservar os recursos e
serviços ambientais necessários à sobrevivência humana. Desde
então, existe um grande movimento de governos, empresas e ONGs que
buscam criar parâmetros para o desenvolvimento sustentável.
Um dos parâmetros mais aceitos é o
Triple Bottom Line, que estabelece a necessidade de um equilíbrio
entre as ações e resultados econômicos, ambientais e sociais das
organizações. Ou seja, uma organização sustentável precisa ser
economicamente lucrativa, ambientalmente correta e socialmente
responsável. Mais: as ações de sustentabilidade precisam ser parte
das estruturas de gestão das organizações e não apenas ações
pontuais.
As empresas estão habituadas a
realizar ações de filantropia, em que doam seus recursos, sejam
financeiros ou materiais, para a realização de eventos em prol de
terceiros. Essas ações são o primeiro passo em uma escalada em
direção à sustentabilidade. Têm apenas o caráter eventual ou até
mesmo de marketing. O segundo passo são as ações de
Responsabilidade Social. Nesse caso, as empresas assumem compromissos
e estabelecem metas de desempenho para suas ações socioambientais.
Empresas socialmente responsáveis
atuam além do que exige a lei, de forma permanente e como parte de
seus planejamentos estratégicos. Esse é o caso, por exemplo, de
organizações que fazem trabalhos de formação profissional para
públicos distintos, que têm um relacionamento permanente com seus
stakeholders. Essas organizações têm a percepção de que existem
outros valores desejáveis além do lucro. Sabem, por exemplo, que
passivos sociais e ambientais podem ter um impacto negativo sobre sua
marca e cuidam para que eles não existam ou que sejam neutralizados.
No entanto, esses são apenas os
dois primeiros passos. Existe na Bíblia um antigo provérbio que
muito bem se aplica na definição dos conceitos de Filantropia,
Responsabilidade Social e Sustentabilidade: dar o peixe a quem tem
fome é Filantropia; ensinar a pescar para garantir o alimento é
Responsabilidade Social; no entanto, cuidar da qualidade da água do
rio, preservar suas margens e suas nascentes, cuidar para que não
seja poluído e nem assoreado, e que existam peixes para sempre, é
Sustentabilidade.
A sustentabilidade é um compromisso
com o futuro, não é uma meta que possa ser atingida, mas um caminho
que as organizações devem trilhar em busca de melhores soluções
para os problemas humanos, sejam econômicos, sociais ou ambientais.
Esse compromisso com o futuro se expressa de diversas maneiras e em
distintos graus dentro das organizações. O fundamental é que
esteja sempre permeando qualquer decisão dentro dos processos de
gestão. Nenhuma ação humana ou empresarial está isenta de
impactos e todos eles devem estar previstos de forma a poderem ser
neutralizados ou minimizados.
Ser sustentável é, portanto, o
exercício cotidiano da responsabilidade e a busca permanente por
menos e menores riscos e externalidades negativas. E essa forma de
gestão deixa de ser apenas uma busca da satisfação dos acionistas,
para colocar a organização em uma nova trajetória, na qual sua
ação passa a ser parte do processo civilizatório que deverá levar
a sociedade humana a ter mais e melhor qualidade de vida nos próximos
séculos.
A contribuição das empresas para
esse processo civilizatório, em que as organizações têm muito
mais recursos e poder do que os Estados, será determinante para
mudanças estruturais nos modelos atuais de produção e consumo,
onde o lucro é um valor absoluto e permanente. A busca pelo lucro
deverá seguir movendo as empresas. No entanto, entra na equação um
novo componente: o tempo. O lucro espalhado no tempo, com objetivos
que garantam a perenidade das empresas. Esse é um novo paradigma que
deverá ocupar os corações e mentes dos gestores.
* Dal Marcondes
é jornalista, diretor da Envolverde e especialista em meio ambiente
e desenvolvimento sustentável.
Fonte:
ENVOLVERDE
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