Memória Terramérica – Amazônia Azul, a nova fronteira brasileira.
por Fabíola Ortiz, especial para o
Projeto Terramérica
Rio de Janeiro, Brasil, 27 de
abril de 2015 (Terramérica) – O Oceano Atlântico é a última
fronteira no leste do Brasil, mas ainda é uma incógnita a dimensão
total de sua biodiversidade, e a pesquisa científica e a proteção
em torno dela segue atrasada com relação à exploração de
recursos como o petróleo.
A Amazônia Azul, como as
autoridades brasileiras chamam essa região rica em biodiversidade e
recursos energéticos de seu mar patrimonial, possui área semelhante
à da selva tropical brasileira ou cerca de metade do território
continental do país. Por essa costa também saem 95% das exportações
brasileiras, segundo dados oficiais.
A plataforma marítima brasileira
guarda 90% das suas reservas petrolíferas provadas e 77% das
gasíferas. E o grande desafio é proteger as riquezas da Amazônia
Azul ao longo dos 8.500 quilômetros de costa.
Um petroleiro navega na baía de
Guanabara, na costa do Rio de Janeiro. A cerca de 250 quilômetros da
costa fica uma jazida de petróleo pré-sal, a grande riqueza
econômica da chamada Amazônia Azul.
Foto: Fabíola Ortiz/IPS
“Não nos fixamos na grandiosidade
desse território. Para se ter uma ideia, a Amazônia Azul se compara
ao tamanho da Índia”, afirmou ao Terramérica o diretor do
Instituto de Estudos Estratégicos da Universidade Federal
Fluminense, Eurico de Lima Figueiredo. Para este cientista político,
“não estamos preparados para cuidar dela, mesmo sendo considerada
uma prioridade política e econômica do país”.
Figueiredo, que presidiu a
Associação Brasileira de Estudos de Defesa entre 2008 e 2010,
assegurou que a Amazônia Azul é uma expressão que busca denominar
territórios vinculados aos novos tratados do direito marítimo
internacional. O Brasil está entre os dez países do mundo com maior
plataforma continental, em um oceano como o Atlântico, que mantém
oculta uma incalculável riqueza marinha, com grandes potencialidades
econômicas, científicas e tecnológicas.
Segundo a Convenção das Nações
Unidas sobre o Direito do Mar, a Zona Econômica Exclusiva (ZEE) de
cada país inclui seu mar territorial, de 12 milhas náuticas desde a
linha de base, a zona contígua, que chega até as 24 milhas, e o mar
patrimonial, que alcança até 200 milhas náuticas (370 quilômetros
lineares). No caso do Brasil, a ZEE originalmente superava os 3,5
milhões de quilômetros quadrados.
A esse território o país solicitou
o acréscimo de outros 963 mil quilômetros quadrados, que diferentes
instituições nacionais, incluídas as científicas, reivindicam,
argumentando que representam o seguimento natural do talude de sua
plataforma continental. A Comissão de Limites da Plataforma
Continental da Convenção, formada por 148 países, até agora deu
razão ao Brasil na incorporação à sua ZEE de 771 mil quilômetros
quadrados, enquanto permanece pendente a decisão sobre o restante.
A reivindicação brasileira, ao
menos na expansão da plataforma concedida até agora, atende os
requisitos da Convenção da Organização das Nações Unidas (ONU)
e dá ao país beneficiado poder para explorar os recursos existentes
na área ampliada e o obriga a manter responsabilidades em seu
manejo.
O reconhecimento a favor do Brasil,
ainda que não seja total, não deixa de levantar desconfiança entre
alguns vizinhos, pelos imensos interesses econômicos na plataforma
continental adicional concedida.
Figueiredo explicou que agora o
grande desafio é monitorar e proteger sua plataforma marítima. “Não
temos plena soberania em relação aos territórios marítimos. A
sociedade brasileira não sabe da necessidade e importância de se
proteger a Amazônia Azul. Há uma grande carência em relação às
nossas necessidades”, ressaltou.
Em 2005 foi aprovado um plano de
modernização da Marinha com investimento estimado em US$ 30 bilhões
até 2025. A defesa de um país é complexa, segundo Figueiredo, pois
reúne dimensões como a militar, a econômica ou a técnica e a
científica.
Atualmente, a velocidade com que são
explorados os recursos marinhos – como os hidrocarbonos situados
sob uma camada de sal de mais de dois mil metros, a 250 quilômetros
da costa e a sete mil metros de profundidade – é muito mais rápida
do que o ritmo das pesquisas científicas. Os depósitos de pré-sal,
descobertos há uma década, colocariam o Brasil entre os dez países
com maiores reservas de hidrocarbonos do mundo, enquanto já fornecem
27% dos mais de três milhões de barris equivalentes de petróleo e
gás que o país produz por dia.
“Essa região pertence ao Brasil.
O país assumiu compromissos junto à ONU para monitorar e estudar os
recursos vivos e não vivos, como petróleo, gás e minérios. Se não
a preservarmos, vamos perder essa grande riqueza”, pontuou ao
Terramérica o oceanógrafo David Zee, da Universidade Estadual do
Rio de Janeiro. Em sua opinião, o Brasil está longe de cumprir os
compromissos assumidos junto à comunidade internacional.
“A ONU nos impõe deveres e
pesquisa científica. Temos que tratar com mais cuidado nossos
recursos marinhos”, afirmou Zee. Além da riqueza hidrocarbonífera,
em grande parte da ZEE se sobrepõe o bioma da Mata Atlântica, que
se estende por 17 Estados brasileiros, 14 deles costeiros.
A organização SOS Mata Atlântica
afirma que as zonas costeiras e marinhas representam a transição
ecológica entre ecossistemas terrestres e marinhos, como mangues,
dunas, escarpas, baías, estuários, arrecifes, corais e praias. A
riqueza biológica desses ecossistemas converte as áreas marinhas em
grandes “viveiros” naturais. Além disso, o litoral é composto
por águas frias ao sul e quentes a nordeste, contribui para a
diversidade biológica e dá abrigo a numerosas espécies de fauna e
flora.
Entretanto, só 1,5% da zona
marítima brasileira está sob alguma figura de proteção, ressalta
a organização. Nesse contexto, assegurar a soberania nacional sobre
as águas jurisdicionais ainda é um grande desafio político e
militar. Em março, cerca de 15 mil militares e 250 embarcações e
aeronaves da Marinha brasileira participaram da Operação Amazônia
Azul, a maior já realizada em suas águas patrimoniais.
“Esta foi uma oportunidade de
capacitação para garantir a segurança da navegação, a repressão
a crimes e o patrulhamento em alto mar. A missão abrangeu toda a
extensão territorial do Brasil”, disse à IPS o capitão de
corveta Thales da Silva Barroso Alves, comandante de um dos três
patrulheiros oceânicos que o país possui para monitorar a Amazônia
Azul.
Essas embarcações fiscalizam a
muito extensa costa em “áreas de grande interesse econômico,
exploração e acidentes. A pesca ilegal também é recorrente”,
ressaltou Thales. O capitão afirmou que a extração dos recursos do
mar deve ser feita de forma “consciente e sustentável”, com a
finalidade de preservar a biodiversidade.
O cientista político Figueiredo
compartilha desse ponto de vista. “Defender a Amazônia Azul passa
por nossa capacidade de desenvolver meios técnico-científicos para
proteger a biodiversidade nessa área tão extensa”, enfatizou.
Envolverde/Terramérica
* A autora é correspondente da
IPS.
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Artigo produzido para o
Terramérica, publicação ambiental que circulou de 1995 a 2015 em
toda a América Latina e Caribe – projeto de comunicação dos
Programas das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma) e para o
Desenvolvimento (Pnud), realizado pela Inter Press Service (IPS) e
distribuído pela Agência Envolverde.
Fonte:
ENVOLVERDE
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