Índios do
Xingu trocam a pesca pela agricultura.
Por Mario Osava, da IPS/Envolverde
Miratu, Brasil, abril de 2017 – O rio não morreu,
mas está muito doente. Os peixes estão fracos e já não alimentam os índios como
antes e nem rendem dinheiro com a venda para garantir a compra de artigos na
cidade. Além disso está perigoso navegar. Essa situação empurrou os índios que
vivem na Volta Grande do Xingu para outra atividade, a agricultura. Tudo isso é
parte dos efeitos da represa de Belo Monte, a terceira maior hidrelétrica do mundo
e a segunda maior do Brasil.
A mudança de comportamento é mais ampla, inclusive
cultural. O transporte pelos bascos está sendo substituído pelos caminhos de
terra, principalmente de motocicletas. O rio, com seus movimentos agora
imprevisíveis deixou de ser um companheiro confiável e central na vida das
aldeias.
Agostinho Juruna, que com seus 10 filhos, busca
novas fontes de alimentos depois que a usina de Belo Monte entrou em operação.
Foto: Mario Osava.
“Os peixes que comem frutas, como os Pacus, vão
acabar, porque não têm o que comer, a frutas estão caindo na terra seca”,
lamenta Agostinho Pereira da Silva, o patriarca da aldeia de Miratu, onde vivem
cerca de 20 famílias do povo Juruna, que acolheram a reportagem da IPS em mais
de uma jornada.
O Pacu (Myloplus e Myleus spp) é a espécie de maior
consumo entre os moradores. Para manter a população da espécie é preciso que o
rio continue a alagar as margens em enchentes que duram meses, fazendo as
frutas da região cair na água. A hidrelétrica eliminou essas cheias ao reter as
águas rio acima e canalizar sua força para os geradores.
O sarobal, uma fruta de áreas alagadas, está
morrendo nos igarapés secos e os peixes morrem de fome, explica Jailson Juruna,
de 37 anos e um dos 10 filhos vivos de Pereira. Ele diz que os tracajás também
estão morrendo, referindo-se a uma espécie de quelônio de nome científico
Podocnemis unifilis, também importante para a alimentação dos índios.
Nos três meses seguintes ao fechamento das
comportas mais de 16 toneladas de peixes apareceram mortos, segundo comprovou o
IBAMA. A empresa Norte Energia, dona de Belo Monte recebeu uma multa de US$ 11
milhões, mas está recorrendo.
Área alagada pela represa de Belo Monte.
Com o fechamento da represa a situação se agravou
porque a mortandade de peixes assustou os consumidores de Altamira, a maior
cidade da região, com cerca de 150 mil habitantes. Os compradores temem que os
peixes estejam doentes.
A participação do pescado na alimentação dos
indígenas caiu drasticamente para menos da metade do que era anos das
obras. “Os Juruna estão perdendo a segurança alimentar e terão de
trabalhar na agricultura ou buscar empregos, com isso perdem também sua
cultura”, explica Biviany Rojas, advogada do ISA (Instituto Socioambiental).
A maior parte das receitas dos Jurunas vinha da
coleta e venda de peixes ornamentais, o que atualmente é impossível, pois não
existem mais as espécies mais valorizadas.
Editado por Estrella Gutiérrez
Fonte: ENVOLVERDE
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