Zerar o desmatamento na Amazônia é uma das principais contribuições que o Brasil poderá dar à luta contra o aquecimento global.
Especialista defende desmatamento zero na Amazônia para combater mudanças climáticas ONU Brasil.
Zerar o desmatamento na Amazônia é
uma das principais contribuições que o Brasil poderá dar à luta
contra o aquecimento global. A conclusão é do brasileiro e
integrante do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas
(IPCC), Paulo Artaxo, que apresentou neste mês (19), no Rio de
Janeiro, o novo relatório do organismo. A pesquisa aborda as
consequências de uma elevação mundial da temperatura acima dos
1,5º C até 2100. O teto é a aspiração mais ambiciosa do Acordo
de Paris.
Em evento realizado no Museu do
Amanhã pelo Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento
Sustentável (CEBDS), Artaxo alertou que a alteração dos padrões
climáticos já é uma realidade em território nacional. “Várias
regiões, particularmente o Nordeste brasileiro e o norte de Minas,
já sofreram aquecimento entre 2 a 2,5º C”, afirmou o
especialista, lembrando dados do Instituto Nacional de Pesquisas
Espaciais (INPE) sobre o período 1981-2010.
Os valores estão acima do aumento
de 1ºC da temperatura global, verificado desde 2015 em levantamentos
do serviço meteorológico do Reino Unido. A oscilação mundial é
um comparativo com médias dos níveis pré-industriais, antes do
início do século XX.
De acordo com Artaxo, a disparidade
desse índice em relação aos números do Brasil se deve ao fato de
que a média global inclui as variações térmicas nas temperaturas
dos oceanos, que se aquecem mais lentamente. Em ecossistemas
terrestres, o calor ultrapassa a estimativa geral.
A análise do IPCC compara os
impactos ambientais de um aquecimento global a 1,5ºC e a 2ºC até o
final do século. Mas segundo o integrante brasileiro do painel,
ambas as variações vão se traduzir em elevações mais altas da
temperatura no nível nacional e local, com as médias do Nordeste,
por exemplo, subindo de 2,5ºC a 3ºC. Previsões do INPE indicam um
aumento ainda maior, de 4 até 7º C em diferentes partes do Brasil,
num cenário em que os atuais esforços para conter o aquecimento
global não fossem ampliados em todo o mundo.
Embora pareça pequena, a diferença
de 0,5º C significa mudanças dramáticas para a ocorrência de
fenômenos climáticos extremos, perda de biodiversidade, elevação
do nível do mar e desenvolvimento econômico.
“Existem regiões do Nordeste onde
a precipitação já decaiu 60%. Isso é uma alteração muito
significativa para qualquer ecossistema, em particular para uma
região semiárida”, acrescentou Artaxo, que também é professor
do Instituto de Física da Universidade de São Paulo (USP).
Na avaliação do pesquisador, as
tendências de aquecimento e de diminuição das chuvas devem piorar
— e o Nordeste corre o risco de se tornar uma zona desértica. O
especialista ressalta ainda que as mudanças climáticas devem afetar
outras partes do Brasil, como os grandes centros urbanos do Sudeste.
Enchentes e estiagens, como a que atingiu São Paulo e deixou o
estado em racionamento de água, vão se tornar mais frequentes.
Em nível global, manter a elevação
da temperatura dentro do 1,5º C permitiria, por exemplo, salvar de
10% a 30% de todos os recifes de corais. Com o aquecimento a 2º C,
essas formações naturais devem desaparecer por completo do planeta.
O limite mais restritivo também impediria que o degelo da Antártida
se tornasse um fenômeno anual durante o verão. Com o teto menor, os
mares subiriam dez centímetros menos do que a 2º C.
Desmatamento na Amazônia
De acordo com o IPCC, restringir o
aumento a 1,5º C exigirá, até 2050, uma redução a zero de todas
as emissões líquidas de CO2. Atividades humanas que continuassem
dispersando gases do efeito estufa teriam de ser compensadas com
medidas para absorver gás carbônico, como o reflorestamento.
“Isso vale tanto para não queimar
combustíveis fósseis, como petróleo, carvão e gás natural,
quanto para reduzir o desmatamento, por exemplo, da região
amazônica. Esta tarefa é extremamente urgente porque não temos
muito tempo para reduzir estas emissões antes de ocorrer uma
catástrofe climática global”, ressaltou Artaxo.
O analista vê desafios
consideráveis na implementação dessa agenda de sustentabilidade.
Isso porque mesmo com a assinatura do Acordo de Paris, em 2015, as
emissões de gás carbônico aumentaram 2% de 2016 para 2017,
chegando a 36,8 gigatoneladas anuais. Para alcançar a meta do 1,5º
C, seria necessário reduzir o volume de gás carbônico lançado na
atmosfera em 45% até 2030 — tendo como base os níveis de 2010.
Os compromissos de cada país
signatário do Acordo de Paris tampouco seriam suficientes para
conter o aquecimento global — estimado em 2,8º C até 2100 com o
cumprimento das atuais promessas.
Sobre o Brasil, Artaxo enfatizou a
necessidade de “colocar o desmatamento da Amazônia a zero”, uma
das metas do país latino-americano junto ao documento internacional.
“Temos (também) que investir em
energia eólica e energia solar particularmente no Nordeste
brasileiro. O Brasil tem o compromisso de reflorestar 12 milhões de
hectares no Acordo e Paris. Isso também é fundamental se nós
quisermos garantir um meio ambiente saudável para a população
brasileira”, disse o especialista do IPCC.
“Nós precisamos de políticas
públicas sólidas, de governos que tenham políticas de Estado de
longo prazo.”
Sustentabilidade nos
negócios
Ana Carolina Szklo, diretora de
Desenvolvimento Institucional do CEBDS, vê uma conscientização
crescente do setor privado sobre a urgência das mudanças
climáticas. Segundo a gestora, empresas têm tomado a dianteira e
criado sistemas próprios de mitigação e compensação. É o caso
de companhias que adotam estratégias de precificação interna de
carbono, a fim de identificar departamentos e atividades com maior
impacto ambiental.
“A equação (dos negócios) está
desequilibrada porque a gente não está ainda internalizando algumas
variáveis”, afirma a gestora. Segundo o CEBDS, 16 empresas
brasileiras já trabalham com a precificação interna de carbono.
Outras 27 declararam que utilizarão esse tipo de metodologia a
partir de 2019.
Szklo aponta ainda que a
sustentabilidade tem um importante valor de mercado. “Gera lucro e
traz dinheiro. É bom para o meio ambiente, para as pessoas e para as
empresas”, afirmou.
Também sobre o papel do setor
privado no combate ao aquecimento global, o integrante do IPCC, Paulo
Artaxo, disse que “construir produtos que possam ter uma
durabilidade maior, que usem muito menos matéria-prima e que sejam
mais eficientes do ponto de vista do uso de energia é absolutamente
estratégico para o futuro do nosso planeta”.
“Do lado empresarial, nós
precisamos ter as empresas menos preocupadas com o lucro no próximo
balancete e muito mais preocupadas com a sustentabilidade do seu
próprio negócio a médio e longo prazo”, concluiu o pesquisador.
Fonte: EcoDebate
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