Vivemos um hiato temporal brasileiro socioambiental.
Por Sucena Shkrada Resk* –
A agenda socioambiental brasileira
sofre, nas últimas décadas, de um anacronismo crescente, no qual o
que muito do que está escrito nas legislações nacionais e,
inclusive, em tratados internacionais ratificados pelo país, não se
configura na prática da realidade diária. Parece que tudo está
fora do tempo, um passo à frente e dois atrás. Neste contexto, os
órgãos do setor seguem cada vez mais fragilizados no bojo da gestão
pública, reflexo de uma crise multidisciplinar que envolve uma
relação conflitante entre todos os poderes, os “players”
econômicos e a própria sociedade, apesar de uma parcela ativa.
Sendo assim, o que percebemos é que vivenciamos um hiato
estabelecido nesse vaivém. E toda uma história democrática de
construção parece estar sendo limitada atualmente à narrativa
bibliográfica. Estamos em um estado de suspensão e apreensão por
aquilo que ainda está por vir.
Enquanto isso, as taxas de
desmatamento, a poluição e o aumento de emissões de gases de
efeito estufa (GEEs) crescem, junto com a violência no campo. A
biodiversidade acelera no decréscimo de espécies, sendo algumas
consideradas extintas. A saúde humana sofre um significativo
impacto, com a reaparição de doenças de fundo hídrico, entre
outras,, como o câncer, decorrentes de todos os tipos de
contaminantes.
Com esta desconstrução, o
interesse público fica vulnerável neste embate e as premissas
consistentes perdem a força dos argumentos versus ao chamado
movimento de “manada” articulado por interesses setoriais, que se
constroem na generalidade superficial, sem colocar à mesa todos os
cenários possíveis.
Ao traçar uma retrospectiva sobre o
conjunto de legislações ambientais, vimos que o país poderia estar
muito adiante na experiência prática do desenvolvimento
sustentável, se suas políticas nacionais (estaduais e municipais)
estivessem, de fato implementadas. Mas a maioria requer de
regulamentações, fiscalizações regulares, mudança do padrão
cultural de comportamento por meio de um exercício de educação
para a sustentabilidade, desburocratização e de releitura do papel
político para o seu exercício democrático.
Por outro lado, dentro do próprio
sistema governamental há interesses distintos entre as pastas
(ministérios, secretarias), cujas divergências fazem com que o meio
ambiente seja historicamente menosprezado nessas relações de poder.
Sim, se trata de uma questão de poder, que interage com o jogo de
forças nas áreas executiva e legislativa.
Nesse cenário, se encontram
fragilizadas, apesar da resiliente Constituição brasileira de 88, a
Lei de Proteção à Fauna, as Políticas Nacional de Meio Ambiente,
de Educação Ambiental, Recursos Hídricos, Resíduos Sólidos , de
Saneamento, de Desenvolvimento Sustentável dos Povos e Comunidades
Tradicionais, sobre Mudança do Clima, o atual e polêmico Código
Florestal, o Sistema Nacional de Unidades de Conservação (SNUC) ,
as resoluções Conama. Este trabalho “Trajetória da Política
Ambiental” no Brasil, de Adriana Maria Magalhães de Moura (com
dados até 2015) é uma boa fonte de consulta sobre estes importantes
documentos.
O que deflagra de forma mais
emblemática esta disrupção é uma situação recente. O Congresso
brasileiro, por não ter ratificado (depois de quatro anos), o
Protocolo Internacional de Nagoya da Biodiversidade está sendo
excluído como ator nas decisões sobre o tema, no âmbito das
Convenções na Organização das Nações Unidas… Lembrando, que
foi um forte articulador em todo o processo, tendo à frente um
brasileiro na secretaria executiva.
Falar sobre como continua esta
história ainda não é possível, entretanto, cada cidadão pode ter
um papel crucial no que será escrito. Somos mais de 209 milhões!
Veja também no
Blog Cidadãos do Mundo artigos referentes aos temas acima, ao
longo dos últimos anos. É só consultar na busca.
*Sucena Shkrada Resk é
jornalista, formada há 26 anos, pela PUC-SP, com especializações
lato sensu em Meio Ambiente e Sociedade e em Política Internacional,
pela FESPSP, e autora do Blog Cidadãos do Mundo – jornalista
Sucena Shkrada Resk
(https://www.cidadaosdomundo.webnode.com),
desde 2007, voltado às áreas de cidadania, socioambientalismo e
sustentabilidade.
Fonte:
ENVOLVERDE
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