Participação da comunidade é essencial na conservação.
O trabalho com as pessoas que
habitam o entorno de Unidades de Conservação (UCs) é fundamental
para o êxito das ações de preservação, na medida em que os
serviços ecossistêmicos não são apenas explicados, mas
percebidos. Essa terceira parte encerra uma série de reportagens
especiais sobre o trabalho que a Associação Caatinga vem
desenvolvendo na Serra das Almas e que envolve 40 comunidades, no
Ceará e Piauí.
Existem aproximadamente 1.700
famílias no entorno da Reserva Natural Serra das Almas
(RNSA). A maioria vive no município de Crateús, no
Estado do Ceará, nos distritos de Tucuns, Queimadas, Poty e
Ibiapaba; e uma pequena parcela no distrito de Jatobá, no município
de Buriti dos Montes (Piauí). São 40
comunidades, sendo 30 no Ceará e dez no Piauí, incluindo três
assentamentos e duas reservas indígenas (Tabajara e Potiguara).
A Associação Caatinga,
informa o biólogo e coordenador de conservação, Gilson Nascimento,
acredita que, além dos esforços empregados na conservação do
bioma, é preciso promover o envolvimento de toda comunidade do
entorno em planos de ecodesenvolvimento, visando unir a preservação
ambiental com a geração de renda para as famílias das comunidades.
Por esse motivo, criou-se o Modelo Integrado de Conservação
da Caatinga, que foi finalista do Prêmio Fundação
Banco do Brasil de Tecnologia Social, na Edição 2009.
Foram desenvolvidos, junto às
comunidades, projetos que buscam identificar atividades produtivas e
ambientais que gerassem oportunidades e melhorias na qualidade de
vida dos habitantes. Dentre as atividades realizadas, estão: a
construção participativa de cisternas, a produção de mel de
abelhas nativas, de sabonetes e essências naturais de plantas da
Caatinga e de artesanatos, além do replantio de mudas de árvores
nativas em áreas degradadas.
Resultados
- 27 mil pessoas beneficiadas diretamente
- Proteção dos 6.146 hectares de caatinga da RNSA
- Dois planos de desenvolvimento local sustentável elaborados em conjunto com a comunidade
- Dois planos ambientais comunitários elaborados
- 400 agricultores capacitados para o uso de queimadas controladas
Capacitação
- 25 meliponicultores (produtores de mel)
- 14 jovens artesãos
- 30 artesãs em palha de carnaúba
- 12 trabalhadores em granja comunitária
Valor da floresta em pé
“No modelo de gestão da unidade
tanto na RNSA quanto para o desenvolvimento sustentável das
comunidades do entorno, o importante não é só ter a reserva bem
cuidada, mas ter a participação de quem está próximo como aliado.
Mudar um pouco a ideia de explorar a natureza, para ser sustentável.
Um grande exemplo é a Meliponicultura, que
demonstra o valor da floresta em pé”, afirma Gilson.
“A Meliponicultura, no Projeto “No
Clima da Caatinga” (NCC), entra como Tecnologia Social.
Os agricultores do entorno da Reserva Natural Serra das Almas (RNSA)
recebem uma capacitação para o manejo básico com a jandaíra,
abelha sem ferrão, e saem daqui aptos a desenvolver essa atividade”,
destaca Carlito Rodrigues Lima, agente de mobilização da Associação
Caatinga.
Gilson explica que, nas fases 1 e 2
do Projeto “No Clima da Caatinga”, patrocinado pela Petrobras
por meio do Programa Petrobras Sociambiental,
foram capacitados em meliponicultura 86 agricultores familiares das
comunidades do entorno, que receberam 200 enxames. Carlito explica,
no entanto, que a irregularidade das chuvas, que vem se repetindo
desde 2010, afetou muito a atividade.
“Essa ainda não é uma fonte
de renda, mas uma promessa, uma vez que o manejo é fácil e o mel
tem um valor dez vezes superior ao das abelhas africanas com ferrão”,
esclarece.
Cícero Rufino do Nascimento
continua cuidando das abelhas, apesar das dificuldades provenientes
das chuvas irregulares | Foto: Eduardo Queiroz.
No Assentamento Xavier,
nós visitamos a casa do agricultor familiar Cícero Rufino do
Nascimento, tornado também meliponicultor graças ao trabalho da
Associação Caatinga. Ele conta que, antes, vivia só no cultivo de
sequeiro (aquele que depende das águas das chuvas), principalmente
na produção de milho e feijão. Participante do projeto entre 2006
e 2008, recebeu uma colmeia e fez mais quatro.
Em 2009, ainda chegou a tirar um
bocado de mel, mas daí veio a seca e a atividade minguou. Mas ele
não desistiu. “Eu quero muito bem as abelhas. É tão fácil que
até uma criança pode cuidar delas”, declara. Hoje, além do
cultivo de sequeiro, Cícero mantém uma pequena horta no quintal.
“Fora as tecnologias voltadas à
produção, tem as de melhoria de qualidade de vida, como
as cisternas, numa região que a água é bem
salina para o consumo; e o fogão ecoeficiente,
que usa menos lenha e tem uma chaminé que joga a fumaça para fora
da casa, reduzindo o risco de doenças”, ressalta Gilson.
Antônia Generosa Lima está feliz
da vida com o seu fogão ecoeficiente | Foto: Eduardo Queiroz.
Na localidade de Pendência,
conhecemos a agricultora e dona de casa Antônia Generosa Lima, 59.
Hoje, ela gasta menos lenha e tem uma cozinha mais saudável e com
uma aparência bem melhor que antes. “O fogão ecoeficiente
economiza lenha por transmitir melhor o calor para a panela”,
explica Carlito. “Diminuiu a fumaça, é mais rápido”, aprova
dona Generosa.
Na localidade de Santa Luzia, nós
visitamos a agricultora familiar Núbia Cardoso, 51, que transformou
o seu pequeno quintal num verdadeiro oásis, em um ano e seis meses,
graças a uma Tecnologia Sustentável que ainda é um projeto piloto
para a Associação Caatinga, mas que já produz seus primeiros
frutos: o Bioágua (sistema de reúso de águas cinzas).
A agricultora familiar Núbia
Cardoso mostra com orgulho o seu quintal produtivo | Foto: Eduardo
Queiroz.
O Sistema Bioágua,
explica Carlito, foca na limpeza das águas cinzas, usadas na lavagem
de roupas, louças e banho. “Por meio de uma caixa de gordura,
filtro, tanque de reúso e bomba, leva a água ao quintal produtivo”,
enumera.
“Tinha um poço de lama no
quintal, juntava muito mosquito. Só tinha dois pés de goiaba.
Agora, além de goiaba, tem cebola, maxixe, laranja, coco, manga,
mamão, maracujá, cheiro verde, pimenta de todo tipo, uma fartura”,
alegra-se a pequena agricultora Núbia.
Antônio José Rodrigues Vale
conquistou a sonhada cisterna de placas para garantir água às
necessidades básicas da casa | Foto: Eduardo Queiroz.
Em Malinhos, estivemos com Antônio
José Rodrigues Vale, 49, aposentado por invalidez. Ele, que mora
sozinho, conta que estava desesperançoso de conseguir uma cisterna
para ter água para beber e cozinhar, até conhecer a Associação
Caatinga. Ele trabalhava como manobrista em São Paulo e, por causa
de um tumor na coluna, se aposentou e resolveu retornar à sua terra
e conta com o apoio de uma empregada, todas as manhãs.
Fonte: ENVOLVERDE
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