A responsabilidade socioambiental empresarial existe mesmo na prática?
por Marcus Nakagawa
O ano letivo nas escolas e faculdade
está começando e tenho certeza que esta pergunta virá por meio dos
alunos e alunas ou pelos meus colegas professores.
Neste momento muito delicado em que
muitas vidas humanas foram retiradas e um sistema ecológico todo
entrou e está entrando em colapso, fica muito evidente a enorme
preocupação com o controle, a legislação e a gestão do impacto
das ações empresariais no Brasil e no mundo.
Fiquei tentado em escrever ou
comentar como muita gente fez no começo deste triste momento de
Brumadinho (MG). Mas acabei acompanhando e escutando muitas versões
e argumentos, e vi muita gente que da noite para o dia virou
especialista em gestão ambiental, conhecedor de relacionamento com a
comunidade, mineração, geografia e topografia etc.
Não que o conhecimento deva ficar
na alçada de somente um profissional, mas temos que escutar, estudar
e entender os especialistas para emitir opiniões e circular
informações nas redes sociais que, ainda, muitas vezes, podem ser
falsas. O aprendizado é muito importante, mas não podemos
transformar as informações em verdades universais ou em hinos de
torcida de time de futebol.
Já trabalhei em departamentos de
responsabilidade socioambiental e sustentabilidade de grandes
empresas das áreas de alimento e eletrônico, anteriormente, e fico
muito preocupado em ser questionado se estes departamentos são
realmente sérios ou se servem somente como marketing.
Um exemplo é que, dentro destas
mesmas empresas, muitos dos meus colegas colocavam como o
departamento que abraçava árvores e cuidava de crianças e
adolescentes, com um tom muito pejorativo.
Realmente, para trabalhar nestes
departamentos precisa ter muita resiliência para poder atender às
várias demandas dos públicos impactados pela empresa, sabendo que
dentro desses públicos estão também a comunidade e o ambiente.
Os interesses são muitos, partindo
pelos acionistas e as entregas de resultados; os clientes e os
consumidores, por serviços e produtos de qualidade; os fornecedores,
por pagamento em dia e entrega; os funcionários, pelas suas demandas
diárias no trabalho, além de ter que prestar atenção ao processo
produtivo para que não se perca nada.
E ainda existe a gestão da
comunidade do entorno e do ambiente em que está inserido. É um
olhar holístico que os gestores e os acionistas precisam ter cada
dia mais. O olhar linear e a análise do real impacto de cada ação
das corporações precisam ser revistos urgentemente.
A mentalidade dos novos gestores e
acionistas precisa passar pela efetiva ação e pensamento diário do
tripé da sustentabilidade: ambiental, social e financeiro. Este
termo foi cunhado por John Elkington, que publicou em junho de 2018
na Harvard Business Review estar fazendo um recall deste termo.
Neste ano de 2019, o conceito faz 25
anos e Elkington diz que precisa fazer uma afinação ou uma melhoria
como as montadoras fazem com os carros ou geladeiras quando vêm com
problemas.
O visionário diz que daqui a 25
anos poderemos olhar para trás e apontar que neste momento começamos
colocar efetivamente a tríplice hélice na criação de valor e no
código genético do capitalismo, estimulando a regeneração de
nossas economias, sociedades e biosfera.
Se somarmos a esta visão com os
anseios desta sociedade indignada com a falta de foco das empresas,
com as questões ambientais e as sociais, poderemos quem sabe
transformar mais esta realidade.
Além disso, tem muita gente
trabalhando para fortalecer e engrandecer outros movimentos, como o
do capitalismo consciente, empresas B, negócios de impacto social,
finanças sociais, empreendedorismo social, entre outros.
Movimentos estes que estão tentando
agregar nas empresas o real valor das questões ambientais e sociais,
sem esquecer-se do lucro. Mas não levando o lucro dos acionistas
acima de tudo, de vidas, da biosfera e de questões éticas.
Não podemos ser ingênuos e achar
que empresas que buscam seus materiais na natureza têm que ser
extintas de uma hora para outra. Ainda, para este tipo de sociedade,
precisamos buscar a base dos nossos produtos e serviços na natureza.
Mas, não é possível que temos tanta tecnologia, inteligência,
pesquisa e tudo mais para fazer isso sem “machucar” ou impactar
tanto a biosfera e as pessoas.
Temos nanotecnologia, inteligência
artificial, carros e drones andando sozinhos, exoesqueletos, robôs,
biotecnologia, vamos para Marte e para Lua, e não fazemos o básico
de gestão, arriscando vidas e a biosfera por um lucro grande e
rápido.
Temos que repensar neste tipo de
sociedade que queremos. Temos que gerenciar não só no lucro, mas
também nas outras duas partes da hélice: social e ambiental. Temos
que não esquecer de tudo isso que aconteceu com estas famílias e
pessoas que foram expostas e compartilhadas nas redes sociais por
milhares de pessoas.
Não podemos esquecer os rios e as
milhares de plantas e animais que estão morrendo, e tomar uma
atitude no nosso dia a dia.
Sim, as suas decisões diárias
podem afetar tudo! Seja numa decisão na empresa que você trabalha,
na escola que você estuda, ou dentro da sua casa com a sua família.
E não, a responsabilidade
socioambiental não morreu, ela se fortaleceu, pois agora o público
em geral também começa a entender o que uma empresa precisa cuidar
além do seu lucro! A responsabilidade socioambiental tem que estar
na teoria e, principalmente, na prática do dia dia!
Marcus Nakagawa –
Professor da ESPM e coordenador do Centro ESPM de
Desenvolvimento Socioambiental (Ceds), é idealizador e diretor da
Abraps e palestrante sobre sustentabilidade, empreendedorismo e
estilo de vida.
Fonte:
ENVOLVERDE
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