sexta-feira, 11 de janeiro de 2019


A era da irresponsabilidade ou que desenvolvimento queremos?


Por Liliane Rocha

Que desenvolvimento queremos? A frase está no livro A Era do Capital Improdutivo do Ladislau Dowbor e foi ela que de imediato me impactou e me fez parar para escrever este artigo, pois me fez pensar: será que as pessoas têm clareza de que desenvolvimento realmente querem? Estão se responsabilizando – de fato – pelas suas escolhas. E pela consequência destas escolhas?

Instantaneamente voltaram à minha mente algumas reflexões que começaram a me angustiar durante as aulas de MBA de Gestão da Sustentabilidade quando estava tendo acesso a um grande volume de informações que são cruciais para todo e qualquer ser humano, mas que infelizmente só uma parcela da população tem acesso.

Me fez lembrar também do Relatório Prosperity Without Growth ou em tradução livre prosperidade sem crescimento que lança luz sobre questões como essa e sobre qual é a nossa responsabilidade, ou irresponsabilidade, diante de temas e realidades tão críticos.

Pude mergulhar nestas temáticas a fundo e sair da superfície. Não somente na teoria, mas na prática, já que o aprendizado se deu em grande parte trabalhando dentro de grandes empresas, em interface com poder público, organizações, sociais e comunidade. Enfim, tudo isso dito, na tentativa de que você, leitor, atente ainda mais para essa discussão. Que desenvolvimento queremos? Em um momento no qual muitos afirmam almejar o crescimento econômico do Brasil, derrapando em discursos nos quais por vezes parece que “vale tudo”. Vale comprometer o meio ambiente? Vale deixar uma parcela da população para traz?

Crescimento econômico é a prioridade do dia na agenda de boa parcela da população. Aspecto que considero legítimo uma vez que a instabilidade econômica tem sido um dos temas centrais no Brasil dos últimos tempos. As perguntas sobre as quais proponho reflexão são: será que o crescimento econômico almejado corresponderá a desenvolvimento para todos? Ou, será que corresponderá a uma sociedade mais próspera?

Vejamos, apenas 1% da água do planeta está disponível para consumo, o Brasil detém a maior reserva de água doce do planeta (12% do total disponível). Ainda assim estamos enfrentando a crise hídrica em estados do país nos quais esse não era nem de longe um desafio há algum tempo. Situação que se amplia claramente devido às mudanças climáticas e ao desmatamento crescente. O Sistema da Cantareira, por exemplo, estava em 38,2% no período pré-crise em 2010, e em 34,7% em 21/10/2018. Apesar da escassez hídrica ter parecido cair no esquecimento durante o período eleitoral.

A gestão de resíduos também está na pauta do dia. No Brasil, cada um de nós produz 380 quilos de lixo por ano. São ao todo 63 milhões de toneladas de lixo gerados, dos quais 24 milhões de toneladas seguirão para destinos inadequados como lixões. Seguimos com a crise da matriz energética, apesar do Brasil ter avançado, pois chegamos em 12% de energia eólica na composição da matriz brasileira.

Temas ambientais latentes, que se conectam fortemente às questões sociais ao passo que vivemos em um país de extrema desigualdade, onde certamente os impactos da questão ambiental recaem com mais peso sobre os mais pobres. O relatório País Estagnado: um retrato das desigualdades brasileiras lançado, em 2018, pela Oxfam, nos mostra que o Brasil é o 9º país mais desigual do mundo. Ou seja, há uma parcela da população brasileira que está na linha de frente quando falamos em falta de água, energia, acúmulo de lixo, problemas de saúde gerados pela poluição, entre outros.

Como diz o relatório Prosperity without Growth “o retorno aos negócios na forma usual não é uma opção”. Eu acrescentaria o retorno ou retrocesso em termos de práticas governamentais também não é uma opção. A prosperidade para poucos, pautada na destruição ecológica e na desigualdade social sistêmica não é mais um caminho viável em uma sociedade civilizada.

Caso contrário, se é que vamos realmente retomar a economia, ela não valerá a pena, pois a conta dos impactos ambientais e da parcela da população deixada para trás irá chegar, e ela será bem cara.

Fonte: ENVOLVERDE

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