A era da irresponsabilidade ou que desenvolvimento queremos?
Por Liliane Rocha
Que desenvolvimento queremos? A
frase está no livro A Era do Capital Improdutivo do Ladislau Dowbor
e foi ela que de imediato me impactou e me fez parar para escrever
este artigo, pois me fez pensar: será que as pessoas têm clareza de
que desenvolvimento realmente querem? Estão se responsabilizando –
de fato – pelas suas escolhas. E pela consequência destas
escolhas?
Instantaneamente voltaram à minha
mente algumas reflexões que começaram a me angustiar durante as
aulas de MBA de Gestão da Sustentabilidade quando estava tendo
acesso a um grande volume de informações que são cruciais para
todo e qualquer ser humano, mas que infelizmente só uma parcela da
população tem acesso.
Me fez lembrar também do Relatório
Prosperity Without Growth ou em tradução livre prosperidade sem
crescimento que lança luz sobre questões como essa e sobre qual é
a nossa responsabilidade, ou irresponsabilidade, diante de temas e
realidades tão críticos.
Pude mergulhar nestas temáticas a
fundo e sair da superfície. Não somente na teoria, mas na prática,
já que o aprendizado se deu em grande parte trabalhando dentro de
grandes empresas, em interface com poder público, organizações,
sociais e comunidade. Enfim, tudo isso dito, na tentativa de que
você, leitor, atente ainda mais para essa discussão. Que
desenvolvimento queremos? Em um momento no qual muitos afirmam
almejar o crescimento econômico do Brasil, derrapando em discursos
nos quais por vezes parece que “vale tudo”. Vale comprometer o
meio ambiente? Vale deixar uma parcela da população para traz?
Crescimento econômico é a
prioridade do dia na agenda de boa parcela da população. Aspecto
que considero legítimo uma vez que a instabilidade econômica tem
sido um dos temas centrais no Brasil dos últimos tempos. As
perguntas sobre as quais proponho reflexão são: será que o
crescimento econômico almejado corresponderá a desenvolvimento para
todos? Ou, será que corresponderá a uma sociedade mais próspera?
Vejamos, apenas 1% da água do
planeta está disponível para consumo, o Brasil detém a maior
reserva de água doce do planeta (12% do total disponível). Ainda
assim estamos enfrentando a crise hídrica em estados do país nos
quais esse não era nem de longe um desafio há algum tempo. Situação
que se amplia claramente devido às mudanças climáticas e ao
desmatamento crescente. O Sistema da Cantareira, por exemplo, estava
em 38,2% no período pré-crise em 2010, e em 34,7% em
21/10/2018. Apesar da escassez hídrica ter parecido cair no
esquecimento durante o período eleitoral.
A gestão de resíduos também está
na pauta do dia. No Brasil, cada um de nós produz 380 quilos de lixo
por ano. São ao todo 63 milhões de toneladas de lixo gerados, dos
quais 24 milhões de toneladas seguirão para destinos inadequados
como lixões. Seguimos com a crise da matriz energética, apesar do
Brasil ter avançado, pois chegamos em 12% de energia eólica na
composição da matriz brasileira.
Temas ambientais latentes, que se
conectam fortemente às questões sociais ao passo que vivemos em um
país de extrema desigualdade, onde certamente os impactos da questão
ambiental recaem com mais peso sobre os mais pobres. O relatório
País Estagnado: um retrato das desigualdades brasileiras lançado,
em 2018, pela Oxfam, nos mostra que o Brasil é o 9º país mais
desigual do mundo. Ou seja, há uma parcela da população brasileira
que está na linha de frente quando falamos em falta de água,
energia, acúmulo de lixo, problemas de saúde gerados pela poluição,
entre outros.
Como diz o relatório Prosperity
without Growth “o retorno aos negócios na forma usual não é uma
opção”. Eu acrescentaria o retorno ou retrocesso em termos de
práticas governamentais também não é uma opção. A prosperidade
para poucos, pautada na destruição ecológica e na desigualdade
social sistêmica não é mais um caminho viável em uma sociedade
civilizada.
Caso contrário, se é que vamos
realmente retomar a economia, ela não valerá a pena, pois a conta
dos impactos ambientais e da parcela da população deixada para trás
irá chegar, e ela será bem cara.
Fonte: ENVOLVERDE
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