EDP deixa casal de velhinhos doentes sem energia elétrica e apresenta conta de R$ 10 mil.
por Júlio Ottoboni,
Editor – Chefe da Envolverde –
O Brasil envelhece e seus
governantes e empresas não aprenderam a tratar o idoso e muito menos
cumprir o Estatuto que rege essa relação. Provas da crueldade
abarrotam tanto o cotidiano como as ações dos governos, elas vão
além do caso recente da aposentadoria com idade ampliada para cobrir
o rombo previdenciário por má gestão e corrupção, partem também
das empresas, entre elas bancos e prestadoras de serviços
essenciais. Segundo levantamento da Coordenação-Geral dos Direitos
do Idoso, vinculada à Secretaria Especial de Direitos Humanos (SDH),
do governo federal, os bancos estão entre os mais lesivos aos
Direitos dos Idosos.
Mas as concessionárias não ficam
atrás. Por exemplo, a falta de energia elétrica a um casal de
idosos impede que ambos vivam com dignidade e contraria regras da
legislação brasileira, como o Estatuto do Idoso (Lei 10.741/03). A
decisão foi tomada pela 3ª Câmara de Direito Público do Tribunal
de Justiça de São Paulo.
A EDP Energia de São Paulo mostra
que não só ignorou isso como extrapolou qualquer limite do bom
senso, da legalidade e da dignidade humana quando no começo de
março cortou a eletricidade de um casal de idosos humildes e doentes
em Taubaté, no Vale do Paraíba, os deixando sem o fornecimento por
praticamente uma semana.
A brutalidade foi cometida contra
Isabel Rabelo dos Santos, de 65 anos, recém operada de um câncer
agressivo, e seu marido, Benedito Hilário, de 67 anos, que trabalha
de porteiro, desesperou o casal com a “conta extra” de R$ 10 mil
sobre as demais despesas, todas regiamente pagas, do fornecimento de
energia pela EDP Bandeirante. Uma empresa que traz em sua ficha
corrida também o fato de mutilar árvores por onde passa sua fiação
e ficar impune também neste crime.
A manicure Isabel Rabelo dos Santos,
moradora numa casa simples no Jardim Mourisco, em Taubaté, tem
passado por sessões semanais de quimioterapia. Benedito é
diabético, usa um aparelho de ventilação respiratória e a
geladeira para manter a insulina, e teve de diminuir o ritmo do
serviço de porteiro noturno de um prédio, que reforçava sua
pequena renda de aposentado, para acompanhar a esposa no tratamento,
sua companheira num casamento de 44 anos.
Gente humilde, honesta e que
enfrenta uma rotina de lutas diárias para sobreviver. Mas isso pouco
importante para a voracidade do lucro e do ganho contabilizado no
último dia 5 de março quando funcionários da EDP cortaram a
energia da residência e o caso ganhou contornos dramáticos, para
não dizer criminosos. E só religada no último dia 9, depois de
muita tensão, sofrimento e angústia, após o pagamento de quase R$
8 mil com dinheiro emprestado.
Apesar das contas mensais estarem
todas em dia, a alegação da concessionária era que o
reestabelecimento da energia ocorreria somente mediante pagamento de
uma “conta extra” de R$ 9.654,61, de um valor “não calculado”
em razão de um mau funcionamento do relógio de luz. Algo que é de
inteira responsabilidade da empresa, pois a averiguação de seus
equipamentos é de sua exclusiva competência.
Segundo a EDP existe uma falha no
antigo marcador analógico de consumo, que ocorre desde 2001. Uma
bobina estaria desconectada dentro do aparelho, o que levaria ao não
registro de parte da energia. A quantia adicional estipulada, no
entanto, seria a soma da energia não registrada pelo relógio entre
novembro de 2014 e novembro de 2017, segundo a concessionária. Como
num passe de mágica, sem dizer sequer qual foi a base de cálculo, a
não ser que foi baseado nos novos medidores, a EDP Bandeirante
chegou a número astronômico de R$ 10 mil.
A companhia mutiladora de árvores,
não se conteve com o ‘provável’ prejuízo e manteve a
interrupção do fornecimento de energia elétrica, mesmo avisa que
se tratava da moradia de um casal de velhinhos doentes e que estava
com suas contas em dia. A religação foi efetuada depois que a
distribuidora reduziu o valor da ‘conta extra’ para R$ 7.986,82,
se o pagamento fosse à vista.
Desesperado e coagido, Benedito
Hilário, que é diabético e depende da geladeira para conservar a
insulina, aceitou o empréstimo de um familiar para restabelecer a
energia elétrica. A única flexibilidade apresentada pela empresa
foi o pagamento de R$ 10.191,84 divididos em 48 prestações, com
juros de 12% ao ano. Ou seja, praticamente o dobro da taxa básica do
Banco Central, a Selic, ou quatro vezes mais do que a inflação
oficial do país, que fechou o ano de 2017 em 2,95%.
A empresa disse para a família que
os juros eram compatíveis com o sistema financeiro do Brasil. E que
foram comunicados para aparecer na aferição técnica do aparelho e
sobre os prazos recursais, segundo o relações institucionais da EDP
Bandeirante, Marcos Scarpa, desfiando a defesa da companhia num
rosário burocrático. O casal, mesmo debilitado por doenças, teria
que cumprir a burocracia em São José dos Campos e ainda entrar no
site da companhia, fazendo uso de internet, algo que foge
completamente do cotidiano dessas pessoas, para se qualificar como
necessitadas de energia elétrica.
Segundo o relatório da EDP, o ano
de 2017 “ foi marcado por diversas oportunidades e desafios para a
EDP, que resultaram em um crescimento de 89,4% no Lucro Líquido
ajustado pelos efeitos não caixa, que atingiu os R$ 570 milhões,
possibilitando a distribuição de R$ 367 milhões em dividendos, ou
60% de payout, acima do compromisso mínimo de 50% assumido com
nossos acionistas. Em 2017, fez um resultado destacado neste
segmento, trabalhando de forma integrada com a área Regulatória e
de Planejamento Energético,o que lhe permitiu atingir um EBITDA de
R$ 151 milhões.”
Neste caso o que soa como ironia,
também ganha contornos um tanto hipócrita, e o mesmo vem reforçado
no relatório da movimentação financeira da empresa ( de
capital português), no pronunciamento do presidente da EDP, Miguel
Setas.
“ Em 2017, reafirmamos o nosso
compromisso com os Princípios do Pacto Global e incorporamos à
nossa estratégia os Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODSs)
estabelecidos pela Organização das Nações Unidas. Para nós a
Sustentabilidade faz parte do nosso negócio, no dia-a-dia. E os
reconhecimentos obtidos nesta área foram prova desse compromisso. “
O Pacto Global é uma iniciativa
desenvolvida pelo ex-secretário-geral da ONU, Kofi Annan, com o
objetivo de mobilizar a comunidade empresarial internacional para a
adoção, em suas práticas de negócios, de valores fundamentais e
internacionalmente aceitos nas áreas de direitos humanos, relações
de trabalho, meio ambiente e combate à corrupção refletidos em 10
princípios.
Quanto aos Direitos Humanos, as
empresas devem apoiar e respeitar a proteção de direitos humanos
reconhecidos internacionalmente; e assegurar-se de sua não
participação em violações destes direitos.
O Defensor Público José Luiz
Simão, professor de direito constitucional e teoria geral do Estado,
explica que serviços essenciais são contínuos e essa garantia
decorre do texto constitucional. Dessa forma, o corte intencional de
energia para a residência do casal de idosos não poderia ter
ocorrido.
“A legislação deve obediência
aos vários princípios constitucionais que dirigem suas
determinações. Entre esses princípios encontram-se os da
intangibilidade da dignidade da pessoa humana e da garantia à
segurança e à vida”. O jurista entende que, a despeito do
processo administrativo promovido pela concessionária ter sido
realizado unilateralmente, sem a necessária defesa da parte
acionada, o “principio da dignidade da pessoa humana”, deveria
prevalecer disse o defensor.
Com sua dignidade coloca a prova,
abalado por tantos percalços da vida, Benedito, indignado e abalado
emocionalmente comentou o caso , que agora vai para as esferas
judiciais.
“Eu nunca ousei me aproximar do
relógio em razão do perigo de uma descarga elétrica. E
periodicamente funcionários da empresa passavam em casa para medir a
luz e nunca comentaram sobre alterações. Sempre recebemos e pagamos
as duas contas sem atraso” disse Hilário. “Foi uma grande
surpresa receber esse tipo de acusação depois de tantos anos. Nossa
prioridade nesses últimos meses tem sido ajudar a minha esposa com o
tratamento e com os afazeres da casa.”
Em Nota Oficial, emitida à
imprensa: “A EDP São Paulo reitera que está à
disposição para as tratativas referentes ao caso mencionado,
conforme orientação já comunicada ao cliente.
A Distribuidora afirma que segue as
normas e os procedimentos da Agência Nacional de Energia Elétrica
(Aneel), órgão que regula o setor, no que diz respeito a
identificação e cobrança de valores devidos por irregularidades no
consumo de energia.
A Companhia atua rigorosamente no
combate a fraudes de energia em duas frentes: inspeções
direcionadas por modelos estatísticos computacionais, que tem como
foco identificar irregularidades no sistema de medição de energia,
e a retirada de ligações irregulares, feitas diretamente a partir
da rede de distribuição, que ficam visíveis às equipes de campo
da Distribuidora.
Em 2017, a Concessionária realizou,
somente em Taubaté, mais de três mil inspeções em campo,
recuperando mais de 2 mil megawatts-hora (MWh) irregulares, volume
suficiente para abastecer o município de Roseira e Potim por um mês.
O objetivo das ações contra o
furto é prevenir acidentes com as ligações precárias e que não
observam os padrões e normas técnicas, também prevê garantir a
qualidade e continuidade do serviço aos clientes que pagam a conta
em dia. Além do alto risco para a população e do impacto negativo
no fornecimento, a fraude faz aumentar o valor da tarifa dos
consumidores e causa prejuízo à Distribuidora. Como o cálculo do
preço abrange também as perdas elétricas da Concessionária, o
custo da energia usada irregularmente pelas pessoas que cometem o
crime é parcialmente repassado a todos os usuários. O estado também
é prejudicado, já que deixa de arrecadar o Imposto sobre Comercio e
Serviço (ICMS), cobrado por meio da conta de luz.
A EDP São Paulo informa que entrou
em contato com o cliente para orientar sobre o caso e está à
disposição para esclarecimentos.
A Distribuidora ressalta que segue a
resolução normativa 414, da Agência Nacional de Energia Elétrica,
órgão regulador do setor elétrico, quanto aos procedimentos de
cobrança de consumo não faturado aplicáveis ao caso. Após a
identificação da ocorrência, por meio de sistema e inspeção em
campo, é encaminhada ao cliente a fatura de energia elétrica mensal
junto com um demonstrativo de cálculo, esclarecendo os valores
cobrados e possibilidade de manifestação do consumidor junto à
concessionária, incluindo tratativa de parcelamento.”, posso
manter essas duas notas como versão da empresa”. O relações
institucionais da EDP, Marcos Scarpa, foi contatado via whatsapp pela
Envolverde e questionado sobre novos posicionamentos da empresa,
inclusive sobre o Estatuto do Idoso às 12h56 e ainda o retorno é
aguardado.
Fonte: ENVOLVERDE
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