O socioambientalismo Página 1 – Nasce um movimento nacional.
por Samyra Crespo –
Às vésperas da Conferência da ONU
sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento de 1992, seu Secretário
Maurice Strong veio ao Brasil para decidir as candidaturas das
cidades que desejavam ser anfitriãs. Tínhamos a candidatura de São
Paulo, de Brasília, de Manaus na emblemática Amazônia e Rio de
Janeiro.
Decidiu -se pelo Rio. Por quê?
Maurice se encantou com a DIVERSIDADE dos atores sociais da cidade e
como protagonistas de diferentes movimentos pareciam conviver e
colaborar entre si. Era um Rio de Betinho, (do IBASE e da futura
Campanha de combate à fome) de Rubem César Fernandes (ISER – que
organizaria a vigília dos líderes espirituais no Aterro do Flamengo
e mais tarde criaria o Viva Rio), do Jorge Durão (da FASE, educação
popular), da trinca de Ouro Alfredo
Sirkis (Os Carbonarios), Gabeira e Carlos
Minc, os três às voltas com a criação de um Partido Verde aos
moldes do que foi instituído na Alemanha. Strong queria que a
sociedade estivesse atenta e participasse da Conferência. No Rio
havia as condições ideais para a mobilização que desejava: uma
efervescência jovem e colorida, carregada de otimismo.
Nesta Conferência, lembremos,
nasceu o conceito de STAKEHOLDERS – os parceiros do desenvolvimento
sustentável. E a ideia inclusiva de que todos, absolutamente todos
tinham nele um papel.
Tudo era novo e o ambiente político
brasileiro era o da redemocratização. Os anistiados voltavam e
encontravam antigos companheiros, alguns traziam experiências novas.
Havia um fluxo de recursos da Cooperação animando novas agendas
como as da Ford Foundation (identidade negra, feminismo), a Heinrich
Boll, a Cooperação americana de apoio a projetos na Amazônia. Os
ambientalistas ainda não conheciam o boom da década seguinte, os
anos pós Conferência. Tinham ainda uma atuação exclusivamente
local e seus militantes eram um bando de idealistas sem formação
específica na área, necessitando sempre da expertise e boa vontade
das universidades.
Recursos de pequena monta.
Pois bem, o Rio foi escolhido.
Dinheiro, esperança e uma certa euforia com a queda do Muro de
Berlim e a utopia de um só mundo.
A tarefa seguinte era chamar as ONGs
e grupos de ativistas de todo o País.
Era preciso articular gente e
idéias. Quem teria essa capacidade?
Logo as ONGs mais estruturadas se
apresentaram: IBASE e FASE. No Rio os grupos ambientalistas tinham se
unido em torno do que chamavam Assembleia Permanente do Movimento
Ambiental.- APEDEMA.
Surgia o FÓRUM DAS ONGS,
articulação nacional para a participação na Conferência que
seria cunhada como ECO 92.
Um saco de gatos.
Do ponto de vista político havia
uma disputa pela hegemonia entre os que historicamente estavam
ligados às agendas sociais e os que se reconheciam como
ambientalistas e com direitos especiais.
Afinal não era uma conferência de
meio ambiente?
Era a primeira vez, no Brasil –
que ambientalistas de todos os matizes se sentavam com lideranças
dos movimentos sociais para estabelecer uma agenda comum.
Eu atuava no ISER, ONG ecumênica
que fazia assessoria às igrejas progressistas em sua “inserção
social”.
Consegui um financiamento para fazer
a primeira pesquisa nacional sobre o ecologismo e sobre o que
pensavam os brasileiros a respeito.
Havia no bastidor uma luta que não
favoreceria nenhum dos lados se fosse à frente.
Se ouvíssemos os ambientalistas
dizia -se que era preciso “ambientalizar” os movimentos sociais.
Se perguntássemos às lideranças sociais, diziam que era preciso
“socializar “, politizar os ambientalistas.
A solução do impasse conhecemos
bem. Betinho se afastou, a FASE passou a representar o segmento
social e um colegiado de ONGs socioambientalistas se formou.
Institucionalmente resolvido o
impasse, vamos ao que interessa: às propostas.
Mas destas falarei amanhã.
Este texto faz parte de uma série
que venho publicando no site Envolverde/Carta Capital. O objetivo é
fazer conhecida a história recente do ambientalismo brasileiro e
requalificar seu papel nas disputas políticas atuais, num governo
francamente anti-meio ambiente.
Samyra Crespo é cientista
social, ambientalista e pesquisadora sênior do Museu de Astronomia e
Ciências Afins e coordenou durante 20 anos o estudo “O que os
Brasileiros pensam do Meio Ambiente”.
Fonte:
ENVOLVERDE
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