Reduzir o consumo diário de carne faz bem para a nossa saúde.
por
Patrícia Kalil –
Um
cardápio bastante possível: começar o dia reforçado com
misto-quente no café da manhã; na hora do almoço, um prato de
picadinho e batata servido com arroz branco; no lanche da tarde, uma
esfiha de carne, um quibe fritinho na hora ou um enroladinho de
presunto e queijo; na hora de jantar, outro lanche com frios ou uma
pizza portuguesa. O que chama atenção é que, sem nos darmos conta,
a carne vermelha esteve presente em todas as refeições, do café da
manhã ao jantar.
Alguns
anos atrás, fui diagnosticada com o nível de colesterol muito
elevado para minha idade e para meu tipo físico. Para não receitar
um medicamento que eu teria que usar para o resto da vida, o médico
pediu para eu tentar fazer uma experiência: reduzir o consumo de
carne vermelha e fazer uma hora de caminhada por dia. Por redução
do consumo de carne, ele explicou, “você
pode comer carne, só tenta não comer em toda refeição. Vamos ver
se a mudança afetará o resultado do seu próximo exame. Ovo está
liberado”.
Parecia um pedido bastante razoável e aceitei o desafio.
A
primeira decisão que tomei foi que não viraria radical.
Por mais que tenha muitos amigos veganos, tenho dificuldade em
recusar comida em algumas situações. Por exemplo, quando estava
começando a nova dieta, tive que morar seis meses em Moçambique.
Logo que cheguei em Beira, a família que me recebeu preparou um
cozido de carne. Além de adorar experimentar pratos tradicionais
locais, tenho realmente dificuldade em rejeitar comida quando me é
oferecida.
Dito
isso, o meu desafio pessoal era saber decidir quando a
proposta era especial: o cozido na África, uma feijoada ou
churrasco com amigos, um charutinho de folha de uva feito por minha
avó libanesa, um cordeiro assado por meu pai, um cozido de panela
feito por minha sogra. Isso tudo me parecia ok comer. Eu precisava,
então, ficar atenta para cortar nas outras ocasiões, que dependiam
exclusivamente de mim. Por exemplo, ao almoçar em um quilo ou mesmo
ao sair pra jantar com amigos onde cada um poderia escolher seu
próprio prato. Nessas situações, eu sabia, a escolha de controlar
meu colesterol estava na minha mão. Comecei a dieta e também a
andar diariamente. Quando refiz meus exames, o nível do colesterol
estava moderado. Vi, como o médico falou, que era possível
controlar a gordura ruim no meu sangue sem medicamento.
Desde então, esse assunto sempre me despertou interesse.
Cabeça de boi ou cabeça de gente
Cabeça de boi ou cabeça de gente
Médicos
argumentam que o consumo excessivo de carne piora doenças
crônicas e cardiovasculares, como também causa alguns tipos de
câncer. Cientistas apontam que a média de consumo de carne por
pessoa também não é praticável com o crescimento da população
global, trazendo prejuízos
para os recursos hídricos, florestais e também para o clima.
Atualmente, a ONU
também pede redução para evitar crise alimentar e 16
países da Comissão EAT-Lancet indicam cada vez mais o
consumo de alimentos de origem vegetal para futuro.
Se cada
um dos quase 8 bilhões de terráqueos comessem carne nas três
refeições do dia, teríamos que aumentar a produção e aceitar a
transformação das
florestas em pasto. O problema disso, como a própria FAO alerta,
é que os ganhos do setor pecuário são de curto prazo e os
prejuízos são de longo alcance para toda a sociedade:
toneladas de rejeitos contaminam os cursos d’água e o próprio
solo, além de ser uma das grandes fontes geradoras de gases de
efeito estufa. O cocô e o pum da vaca esquentam o planeta.
No
Brasil, já temos mais cabeças
de gado do que cabeça de gente, com 218 milhões de bovinos
versus 208 milhões de brasileiros. Segundo informações do IBGE, em
Goías, há três
vezes mais gado que pessoas. O problema então passa a ser social
e político: queremos um governo que cuide dos brasileiros mais que
de bovinos, mas parece que estamos permitindo que bois tenham mais
força política que nós todos juntos. A força da bancada ruralista
no Congresso só evidencia esse fato (44% da Câmara, 39,5% do
Senado). Quando lutamos pelo fim do desmatamento ilegal ou por
proteção dos mananciais, vamos lembrar que a redução do
consumo diário de carne é além de uma questão importante para a
nossa saúde, um ato político em defesa do meio ambiente.
Fonte:
ENVOLVERDE
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