Mais estradas: solução ou
problema para o Brasil?
De acordo com a Confederação Nacional do Transporte
(CNT), 63% das estradas brasileiras têm buracos, rachaduras e outros defeitos
no pavimento.
Depois de fazer um dos maiores programas de
expansão rodoviária no mundo, o país precisa cuidar de suas pistas e investir
em meios de transporte menos poluentes
Quem lê as notícias sobre os problemas das estradas
brasileiras, sobre os acidentes e sobre o quanto elas encarecem a logística
dificilmente imagina que o país foi palco de um dos maiores programas de
expansão rodoviária do mundo depois da Segunda Guerra
Mundial.
Tal ampliação teve um grande impacto no crescimento
econômico e na mobilidade dos brasileiros, mas também gerou problemas
ambientais e de manutenção que o país agora precisa enfrentar.
Essas são duas conclusões do novo informe O
experimento de Brasília – Acesso a estradas e desenvolvimento espacial de longo
prazo, financiado pelo Banco Mundial. O
estudo, feito por Stéphane Straub, professor da Escola de Economia de Toulouse
(França), analisa como a construção da capital no centro do país estimulou a
construção de estradas em todo o território, impactando a economia e a
sociedade por completo.
Entre 1970 e 2000, foram construídos 170 mil
quilômetros de estradas, o que impulsionou metade do crescimento (de 136%) do
PIB nacional no período. População e atividades econômicas se deslocaram da
costa, principalmente do Rio de Janeiro, para o interior, o que dificilmente
teria acontecido se Brasília não tivesse sido inaugurada em 1960.
São Paulo e outras cidades do interior do Sudeste
acabaram sendo o grande foco da migração. Além disso, no Sul, a queda nos
custos de deslocamento fez os brasileiros migrarem cada vez mais das cidades
rurais para as capitais e seus arredores. Finalmente, as capitais do Norte
tiveram uma ligeira queda na população, o que sugere a criação de centros
urbanos secundários.
É por esses motivos que os autores falam em uma
“urbanização ao mesmo tempo centralizada e localizada”. De fato, em 1950 apenas
82 cidades brasileiras tinham mais de 20 mil habitantes; o número, em 2000, era
de 660. Desse total, o número de cidades com população entre 20 mil e 100 mil
passou de 69 para 545 no mesmo período.
Além disso, o número de municípios mais do que
dobrou entre 1960 e 2010, passando de 2,767 a aproximadamente 5,570.
Algumas áreas rurais do Norte, do Nordeste e do
Centro-Oeste – as regiões menos desenvolvidas do país – também foram impactadas
com a expansão das estradas e do agronegócio. Tanto que a participação das três
regiões no PIB nacional passou de 17.3% em 1975 para 24% em 1996 (hoje é de
aproximadamente 30%).
Manutenção problemática
Tamanho crescimento não se deu sem problemas.
Embora o Brasil tenha menor desigualdade espacial hoje do que há 50 anos,
continua um país bastante concentrado. Exemplos de estradas construídas por
razões políticas, e não exatamente por necessidade econômica, também existem
aos montes, como lembram os autores.
Outro problema é o da manutenção dessas rodovias.
De acordo com a Confederação Nacional do Transporte (CNT), 63% das estradas
brasileiras têm buracos, rachaduras e outros defeitos no pavimento.
“Existe um consenso entre os especialistas em
transporte de que a manutenção é uma dificuldade nos países em desenvolvimento”,
destaca Straub. “Os políticos em geral preferem construir novas estradas,
porque são mais visíveis e rendem mais votos, e acabam negligenciando as que já
existem”, completa.
Finalmente, a maior crítica à expansão rodoviária
brasileira é que ela se deu em detrimento das ferrovias e da navegação fluvial.
O país apresenta hoje 214.000 quilômetros de rodovias pavimentadas e 1,3 milhão
de quilômetros de vias não pavimentadas. As estradas de ferro somam 30.000
quilômetros (contra os 38.000 existentes em 1958). Já de hidrovias,
são apenas 13.000 quilômetros.
“Antigamente, o Brasil tinha vários planos para
conectar rios e ferrovias. Mas, quando surgiu o transporte por caminhão e a
carga passou a ser mais fracionada, deu-se a vantagem para as rodovias”,
explica o consultor em transportes Carlos
Riva.
Só que o transporte por estrada sai mais caro, o
que aumenta o preço de todos os produtos, e a falta de manutenção traz riscos a
motoristas e passageiros. Só em 2012, quase
41.000 brasileiros perderam a vida nas estradas. O índice de
mortalidade ultrapassa casos como os da Índia e da China, as economias mais
populosas do mundo.
Menos poluição
“Focar prioritariamente nas estradas também gera
problemas ambientais, porque elas recebem veículos que liberam muito CO2”,
lembra Straub. Considerando-se que em 1945 havia 6 veículos por 1.000
brasileiros em 1945, 37 em 1970 e 219 em 2011, dá para imaginar o quanto as
emissões de carbono (um dos maiores responsáveis pelas mudanças climáticas)
aumentaram desde então.
Tudo isso obriga o Brasil a pensar duas vezes antes
de fazer uma nova ampliação aos moldes da realizada entre 1970 e 2000. “Mas
também não é necessário desistir das estradas. O ideal é equilibrar os
investimentos para estimular outras opções menos poluentes de transporte, como
fluvial e ferroviário”, comenta Straub.
Fonte: Banco
Mundial
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